Desculpem hoje estar a ser temático.

A Olívia, com um ano e oito meses, talvez seja a criança mais nova do mundo a fazer trekings de 20 quilómetros. Eu vi, ninguém me contou. Fá-lo numa cadeira, às costas da sua mãe, a Joana (@jojochapadadiamantina), a maior parte do tempo. Ou pelo seu próprio pé, quando o caminho o permite, com passo curto, ao lado da mãe e de pessoas desconhecidas.

Chovia na Chapada Diamantina (Brasil). O caminho estava escorregadio. Olhávamos a chuva a cair nas lagoas e nas cascatas. Os olhos não conseguiam contar os pingos porque se misturavam com a água. Essa é uma das formas de perceber a importância da água: sabe misturar-se, viver em conjunto. E já agora, alimenta as plantas.

O cão, o Caju, farejava a tarde e levantava a cabeça na direção da Olívia. O silêncio do que não dizíamos acumulava-se durante a caminhada na espera que parasse de chover. As cores estavam mais escuras do que o habitual, mas havia plantas brancas, vermelhas e verdes. A cor é o "olá" de uma planta. A Joana falava com todas elas porque as conhecia, como de uma vizinha que encontra nas escadas se tratasse. Praticava a natureza, no meio da natureza. A planta vassourinha, explicou: chama-se assim porque antigamente se faziam vassouras com ela. A dormideira, adiantou: se alguém lhe tocar, ela fecha-se. É o seu processo químico, a sua defesa. Fazia as plantas sentirem-se mais humanas. E tentava, talvez, que a filha entendesse, desde cedo, que as plantas se podem sentir melhor se falarmos com elas. Como de mulheres se tratasse.

Uma mulher que transporta outra mulher e fala com outras mulheres
créditos: Mal Parado

Para um maior conforto da Olívia, sempre que era possível, Joana desviava-se dos buracos e das pedras como se fosse um carro a poupar os amortecedores. Mas quando passava um carreiro de formigas, saltava-o, e a pequena reclamava. As formigas são passadeiras da natureza, mas ao contrário porque não se podem pisar. Enquanto a tarde existiu, caminhou-se. E enquanto a Joana ganhar caminhos, carregará a Olívia e algum vazio que possa existir nas plantas. Porque ninguém a espera (e é preciso colocar as prestações em dia), nem mesmo o pai da Olívia, provavelmente escondido na sombra alta da lei física de duas mulheres, uma às costas da outra. Essa é uma das formas da importância de ser mulher: saber aguentar-se, viver em conjunto. E já agora, alimentar as plantas.

Ah, quando a pequena crescer e for à escola, chamar-se-á reunião de pais ou reunião de grandes mulheres?

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