Andreia Castro é médica, viajante e... empreendedora. Tinha em mente a criação de um projeto dedicado à consulta do viajante, mas que ia sendo adiado por motivos de agenda. Até que, em 2019, estavam reunidas as condições para arrancar com o site Consulta do Viajante Online® que, atualmente, conta já com uma equipa multidisciplinar de cinco médicos. Foi um "processo natural que reflete muito a forma como eu vivo as viagens: as coisas podem ser feitas com segurança, tranquilidade, e, ao mesmo tempo, serem aproveitadas e serem descontraídas, não têm de ser difíceis", explica Andreia ao SAPO Viagens.

"Água, gelo e vacinas"

Quem já fez uma viagem para outras latitudes, provavelmente, ouviu falar ou teve uma consulta do viajante, mas, para os que ainda não sabem, esta é uma consulta direcionada especificamente para a realização de uma viagem com destino aos países da América Central e do Sul, Ásia e África, sendo também feita para destinos na Europa, em algumas ocasiões. Durante o atendimento, o paciente fica a par dos cuidados de saúde que deverá adotar, recebe dicas atuais e conselhos sobre o destino, fica a saber se deverá fazer alguma medicação ou vacina antes da viagem, além de receber uma explicação, acompanhada de uma receita, se for o caso, de medicamentos aconselhados a levar na mala.

Assim seria uma consulta do viajante ideal, mas nem sempre acontece. "O problema que mais noto é uma grande falta de literacia para a saúde que existe em muitas áreas, mas que nesta área da medicina de viagem é flagrante", refere a médica. Muitas pessoas pensam que a consulta do viajante é para "água, gelo e vacinas". Ou seja, fala-se dos cuidados a ter com a água não engarrafada e prescreve-se vacinas. "Acham que com vacinas ficam completamente protegidas de tudo e mais alguma coisa e não é verdade. Temos doenças que se manifestam só no regresso. Temos situações que não são preveníveis por vacinas", exemplifica a médica e viajante que já visitou cerca de 90 países.

"Confunde-se muito o que são vacinas obrigatórias e vacinas recomendadas. Há pessoas que vêm convictas que têm de fazer certas coisas e não é bem assim, as variáveis a considerar perante cada viagem e cada viajante são enormes. E há também imensos mitos à volta da questão da malária e dos antimaláricos, mas pouca preocupação com a gravidade da doença. Ainda assim, o facto de desempenharmos uma consulta mais cuidadosa e demorada do que o habitual permite-nos trabalhar estes mitos e receios que às vezes existem", considera.

Andreia Castro, médica e viajante
Andreia Castro, médica e viajante créditos: DR

Para Andreia Castro, a parte das vacinas é apenas uma componente da consulta. "As vacinas é o que menos tempo me demora [durante a consulta]. É uma parte muito pequena. Reflete cuidados específicos que não terão importância se tudo resto não for falado", defende. "Muitas vezes, as pessoas acabam por não vir à consulta por desconhecimento ou porque não sabem que riscos podem encontrar no destino e, por outro lado, também desvalorizam a importância deste momento".

"Com uma consulta bem feita é muito raro termos problemas a acontecer em viagem", diz a médica que vai mostrando as suas aventuras através do Instagram. "As pessoas pensam, muitas vezes, que é só uma consulta, mas estão a comprar uma garantia de que vão seguras, tranquilas e, se acontecer alguma coisa em viagem, sabem como lidar com isso", realça.

"Com uma consulta bem feita é muito raro termos problemas em viagem"

Qual é o sentido de investir tanto dinheiro numas merecidas férias e deitar tudo a perder por não ter ido a uma consulta do viajante? "Ao meu ver, isto não faz sentido porque as pessoas estão a investir para ter umas férias, para ter um bom momento e, depois, descartam aquilo que pode fazer, efetivamente, a diferença", afirma a médica.

E, afinal, quais são estes problemas de saúde que podem prejudicar ou estragar por completo uma viagem? Regra geral, "doenças de ordem alimentar, a diarreia do viajante, por exemplo, é muito frequente, e, no que toca à hepatite A ou febre tifoide, aí sim temos vacinas que podemos discutir; depois temos as doenças transmitidas por mosquitos como febre amarela, malária, dengue ou zika (que é super importante para grávidas ou casais que querem engravidar); doenças de transmissão animal (como a raiva, que é extremamente importante por ser 100% mortal); infeções de pele, doença de altitude; problemas relacionados com o mergulho; entre outras".

"Sempre em cima do acontecimento"

Quanto mais completa e personalizada for a consulta, melhor será, uma vez que nada é estanque. Há destinos que podem estar a ser mais afetados por certas doenças e há viajantes com necessidades específicas. Por exemplo, "grávidas e casais que pretendem engravidar", há destinos desaconselhados e, nestes casos, durante a consulta, são aconselhados outros destinos.

Sendo um projeto que funciona na internet, há também a vantagem de poder realizar a consulta por vídeo ou por telefone e com mais do que um participante, por exemplo famílias, casais ou grupos de viajantes. "Nós temos horários muito flexíveis e temos uma equipa multidisciplinar de cinco que cobre vários blocos e competências".

Além disso, "temos mais tempo de consulta do que o habitual. E no fim, enviamos as receitas e outras informações. Consideramos que o nosso serviço só acaba quando a pessoa entra no avião", considera. Sendo que, para quem deseja mais, o projeto também tem a possibilidade de acompanhamento e avaliação durante e após a viagem.

As dicas e conselhos que deixam através das redes sociais são feitas de forma descontraída, e o facto de serem uma equipa de médicos que também são viajantes faz com que estejam "sempre em cima do acontecimento" e que consigam dar um contexto diferente e mais realista. "A medicina de viagens é uma medicina geográfica, de surtos, se não estivermos permanentemente conscientes do que está a acontecer, não podemos prestar um bom serviço ao viajante. E a qualidade e transparência é o nosso maior valor".

"Somos muito descontraídos, mas somos muito rigorosos também. Somos muito rigorosos na parte técnica, mas temos a visão de quem já viajou pelo mundo e sabe enquadrar o que são recomendações médicas numa perspetiva real de quem viaja", conclui Andreia Castro.