É o percurso mais pequeno que a BioRia (Rede de percursos pedestres e cicláveis do concelho de Estarreja) tem para nos oferecer, mas não achem que o tamanho é directamente proporcional à falta de beleza, pois em cerca de dois quilómetros temos o que é, para mim,  um dos percursos mais interessantes de se fazer. Em forma de “U”, o Percurso do Rio Jardim leva-nos por um bosque que liga o Esteiro de Canelas ao Esteiro de Salreu, sempre acompanhados pelo seu rio homónimo. Comecemos com uma pequena contextualização do local.

O município de Estarreja tem mais de 500 quilómetros de frente ribeirinha, onde podemos encontrar diversos esteiros e ribeiras. Esta Zona Húmida, pertencente à Ria de Aveiro, é modelada por um mosaico de habitats, do “Bocage” até zonas agrícolas ou de caniço e junco. Esta mistura faz com que consigamos juntar diversos trilhos e habitats que se encontram sobre a alçada do Património Natural da BioRia.

Trilho do Rio Jardim
Trilho do Rio Jardim créditos: Guilherme Teixeira

A luz da famosa “golden hour”, ao nascer ou pôr-do-sol, é a melhor altura para se visitar a BioRia, mas a primeira luz da manhã é a ideal para fotografar a BioRia. Geograficamente, os trilhos estão virados para oeste. No entanto, durante a semana, a minha disponibilidade é exclusiva para o pôr-do-sol e para a calma que este momento oferece.

Trilho Rio Jardim
créditos: Google Maps/SAPO Viagens

Existem duas hipóteses para chegar ao trilho: por comboio (a partir do Porto ou de Aveiro), descendo no apeadeiro de Salreu, ou de carro até ao mesmo apeadeiro (alternativamente, até à sede da BioRia). Daqui e até ao início oficial do trilho distam aproximadamente 500 metros, feitos por uma ciclovia alcatroada que, contra todo o objectivo do seu uso, também serve de ligação entre os diversos campos agrícolas, onde podemos avistar bandos de pardal-comum (Passer domesticus) ou de bico-de-lacre (Estrilda astrild). A monotonia só é quebrada pelo ocasional alfa-pendular. Chegou a hora de iniciar o trilho!

Trilho do Rio Jardim
O trilho tem início perto do apeadeiro de Salreu créditos: Guilherme Teixeira
Trilho do Rio Jardim
A ciclovia que atravessa a zona créditos: Guilherme Teixeira

Podemos dividir o trilho em duas partes: uma de bosque e outra de terrenos usados para o cultivo do arroz. Os primeiros passos são feitos com a constante companhia do Rio Jardim que, nesta altura do ano e devido aos vários diques que os agricultores fazem, apresenta pouca água. É a casa de espécies como a lontra europeia (lutra lutra) ou o rato de água (Arvicola sapidus). Do lado esquerdo, temos a presença constante dos campos agrícolas divididos pelos corredores ecológicos característicos do Bocage. Atenção redobrada para uma espécie exótica bastante chamativa: o Bispo-de-coroa-amarela Euplectes afer. É durante a época de nidificação (Primavera e Verão), que este passeriforme é mais vistoso. A sua cor amarela e os seus voos horizontais fazem com que seja uma ave bastante fácil de observar, sobretudo quando se encontra a vocalizar junto aos juncos ou espigas de milho.

Trilho do Rio Jardim
O Bispo-de-coroa-amarela com a sua bela plumagem amarela de primavera/verão créditos: Guilherme Teixeira
Trilho do Rio Jardim
O bico-de-lacre-comum é uma das pequenas aves que podem ser avistadas ao longo do trilho créditos: Guilherme Teixeira

A partir daqui, entramos nos campos que estão a ser preparados para o cultivo de arroz. No Inverno, esta parte do percurso é uma maravilha para os amantes de birdwatching ou de fotografia de vida selvagem, pois muitas aves usam estes campos como zonas de alimentação.

O trilho termina no mesmo estradão onde começou, por isso basta virar à esquerda voltarmos ao apeadeiro de Salreu. Este trilho mostra como a agricultura pode coexistir com a biodiversidade e os corredores ecológicos criados podem ser um verdadeiro refúgio para a vida selvagem. O trilho do Rio Jardim oferece uma oportunidade para apreciar a beleza de algumas das espécies mais emblemáticas da região.

Trilho do Rio Jardim
créditos: Guilherme Teixeira

Podem seguir as caminhadas e experiências fotográficas do Guilherme no seu blog, Raw Traveller, onde uma versão deste artigo foi publicada originalmente, e no instagram.