Bilhete-postal por Pedro Neves

Quão bom é chegar de comboio a um sítio novo pela primeira vez? Viajo pela rede ferroviária nacional há algum tempo e é sempre com um misto de curiosidade e entusiasmo que parto a unir mais um dos seus pontos. Neste sábado de manhã, foi a vez de riscar Abrantes da lista de sítios a conhecer.

Já tinha passado várias vezes de comboio pela cidade ribatejana e ficado impressionado pelo espelho de água que contorna a colina onde se ergue. O quadro não é inteiramente natural, pois resulta da instalação de um açude a oeste da cidade, mas produz o efeito pretendido, com o Tejo a parecer tão viçoso quanto no seu estuário.

É bom chegar de comboio, embora o centro histórico ainda fique a 3 quilómetros da estação, o suficiente para me convencer a apanhar um táxi até ao primeiro ponto de interesse da cidade, e o mais elevado: o castelo de Abrantes. A fortificação do século XII oferece uma visão panorâmica de toda a região, incluindo, nesse dia, do fumo provocado pelos incêndios florestais a nordeste, no distrito de Castelo Branco.

O verde dos campos agrícolas e o azul do Tejo formam uma paisagem digna de postal, mas é mais abaixo que a vista encontra o pequeno oásis do Jardim do Castelo, com a sua pequena alameda embelezada por uma fila de canteiros coloridos, tão abundantes em flores que parece duvidoso estarmos em agosto.

Não sou o único a avistar o mar de oportunidades desta pequena bolha de resistência primaveril no alto de Abrantes. Perante tantas zínias de todas as cores, as borboletas pareciam não conseguir decidir-se por qual delas começar.

As espécies que por ali esvoaçavam podiam encher um pequeno borboletário: borboletas-zebras, borboletas-caudas-de-andorinha, borboletas-das-couves, borboletas-do-medronheiro e pelo menos uma bela-dama-americana. Costumo avistar ocasionalmente algumas destas espécies em Lisboa, mas raramente assim, aos pares e no mesmo espaço — um regalo para qualquer amante de borboletas (quando inventamos uma palavra para isto?).

Noutro recanto do jardim, à sombra de uma árvore, um pequeno grupo de pessoas aproveitava a manhã ao ar livre para improvisar um encontro com ar religioso. Enquanto perseguia as borboletas com a máquina fotográfica, calhou escutar um dos últimos pontos da agenda: pedir permissão à câmara municipal para continuarem a poder reunir naquele espaço. O porquê do pedido ficou por ouvir mas pareceu-me óbvio. Ali, nas alturas de Abrantes, entre as flores e as borboletas, o céu parece só um bocadinho mais perto.