
Reportagem por Isabel Kua com Emily Wang / AFP
O nüshu, que literalmente significa "escrita das mulheres" em chinês, foi criado há cerca de 400 anos, quando as mulheres não tinham acesso à educação e, portanto, à escrita. Graças ao nüshu, podiam comunicar entre si por meio de cartas, canções ou até bordados.
Transmitido de geração em geração, de mães para filhas, o nüshu agora ganha força em toda a China, onde é considerado um símbolo de força feminina.
Pan Shengwen, estudante de 21 anos, explica à AFP que o nüshu permite que as mulheres comuniquem com total segurança. "É como um santuário para nós", afirma. "Podemos expressar os nossos pensamentos, compartilhar confidências entre irmãs, falar sobre tudo".
Comparadas aos sinogramas, as palavras são fonéticas, menos quadradas, mais delicadas e têm forma de folhas de árvore. "Quando escrevemos, a nossa respiração deve ser pausada, para que o pincel permaneça estável", explica.
No Xiaohongshu, uma aplicação chinesa similar ao Instagram, o número de visualizações da tag "Nushu" alcança os 72 milhões. A maioria são publicações de mulheres jovens que publicam fotos de tatuagens ou outras criações com esta escrita ancestral.
He Jingying, outra estudante, explica que foi a mãe quem a matriculou num curso de nüshu. A prática, conta, proporciona-lhe "uma profunda sensação de serenidade". "Quando toco o papel com o pincel, sinto uma força interior", afirma.

"Um grito contra a injustiça"
O nüshu é muito mais do que uma simples escrita. Reflete a vida das mulheres do condado rural de Jiangyong, na província de Hunan, explica Zhao Liming, professora da Universidade Tsinghua, em Pequim.
Jiangyong era "uma sociedade dominada pelos homens", explica esta académica que estuda o nüshu há quatro décadas. "As obras dessas mulheres eram um grito contra a injustiça", afirma.

As palavras do nüshu são lidas em um dialeto local, o que complica a aprendizagem para os habitantes de outras regiões. Mas a elegância e a singularidade explicam o renovado interesse por esta escrita, opina a professora He Yuejuan.
"São apreciadas especialmente por estudantes de arte", refere em frente à sua galeria, onde vende joias e xailes adornados com inscrições em nüshu.
Nativa de Jiangyong, a professora conta que o nüshu era "parte da vida quotidiana" durante sua infância. Ela foi considerada uma das 12 "herdeiras" do nüshu reconhecidas pelo governo chinês e tem o direito de ensiná-lo.

"Próprio das mulheres"
Quase 100 estudantes participaram de uma oficina de uma semana organizado pelas autoridades locais para promover o nüshu.
Zou Kexin, uma das jovens presentes, disse à AFP que ouviu falar do nüshu nas redes sociais e queria "testá-lo pessoalmente". "É um sistema de escrita exclusivo para mulheres, o que o torna realmente especial", afirma esta estudante de uma universidade de Sichuan.
Tao Yuxi, estudante de animação de 23 anos, é um dos poucos homens na oficina. Ele conta que quer aprender o nüshu para inspirar as suas criações.
Embora tenha sido criado para mulheres, considera que o nüshu faz parte do património cultural nacional. "Todos devemos lutar para preservá-lo, mulheres e homens", defende.
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